Desde quando a primeira comunidade dominicana chegou na América Latina, foram muitos irmãos e irmãs que se deixaram tocar pelo apelo dirigido por Montesinos. Entre eles está, sem dúvida, Raúl Vera, bispo de Saltillo, Coahuila, México. Seus passos seguem com firmeza os seus predecessores, entre os quais está Bartolomeu de Las Casas, Martin de Porres, Rosa de Lima e tantos outros. Foi bispo na mesma diocese de Las Casas, vale lembrar, e abraçou o mesmo povo, junto com Samuel Ruiz. Raúl, que agora se aposenta do serviço episcopal, ouviu com atenção as palavras que também despertaram Las Casas e que continuam retumbando na nossa tradição dominicana. Ouviu e agiu, devemos acrescentar: sua luta em favor dos direitos humanos o tornaram o bispo dos pobres, dos indígenas, das mães cujos filhos desapareceram, das prostitutas, dos homossexuais, dos camponeses e de todos os que esperam da Igreja consolo, apoio, ajuda. E como sempre nesses casos, a voz e as atitudes de Raúl também incomodaram muita gente. Sofreu atentados, difamações, ameaças. Em uma dessas ocasiões tive a honra de entregar-lhe um abraço da família dominicana brasileira, que me incumbiu de viajar ao México em solidariedade, em 2016. Eu já o conhecia do Brasil, quando ele veio assessorar o encontro da Comissão de Justiça e Paz, ocasião na qual nos impressionou a todos com seu entusiasmo, clareza, juventude, elegância e, acima de tudo, bom humor.
Raúl, como também costuma ocorrer com essa gente abastecida de céu, tem um brilho indescritível no olhar inquieto.
Seus olhos saltam de um lado a outro com a destreza de quem está atento a tudo, a quem tudo desperta e assombra. Perto dele, sentimos claramente que estamos diante da história que ele resume e que ele tornou sua. Em público, é impossível conversar sem que ele seja abordado por pessoas as mais diferentes, todas com alguma palavra, algum pedido, um comentário, um elogio, um abraço. No privado, mantém a atenção e esbanja simplicidade. Agora, aposentado das funções oficiais e à flor da idade, Raúl certamente viverá com mais ardor e com mais vigor a vida que ele escolheu para si e que é exemplo para nós. Como sempre fez, poderá responder positivamente e atualizar a pergunta de Montesinos: “esses não são homens e mulheres e não estão obrigados a amá-los como irmãos?” Agora, como nunca, é preciso de gente corajosa que continue formulando a questão, sob o preço de não sermos dignos do evangelho.
Por Jelson Oliveira
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